A escolha por comprar produtos falsificados pode parecer atrativa para quem vê apenas por fora. Apesar disso, essa opção “barata” pode, por muitas vezes, sair bem mais caro no final. Diante disso, uma pesquisa conduzida pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) revelou o tamanho dos prejuízos para a sociedade, bem como para o poder público e o setor privado, causados pela prática da ilegalidade no país.
A pesquisa Brasil Ilegal, que também contou com a parceria da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) e da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), revela que o Brasil deixa de arrecadar pelo menos R$ 453 bilhões todos os anos. Esse valor equivale a cerca de 4% do Produto Interno Bruto do país no ano passado.
“Esse valor é, realmente, um desastre nacional. Ele atinge todo cidadão, atinge os governos municipais, atinge os governos estaduais, e atinge a União. E, na verdade, são recursos que equivalem a todo o PIB de Santa Catarina. São recursos que vão para o ralo, pois são impostos que deixam de entrar nos cofres públicos”, afirma o diretor da Fiesp e da Firjan na área de segurança, Carlos Erane de Aguiar.
Para chegar a esse valor bilionário, foram contabilizados somente 16 setores da economia. Por conta disso, os responsáveis pelo estudo acreditam que esse valor pode ser ainda maior.
“Então toda a sociedade deve ter essa consciência de que quando adquire um produto ilegal ou pirata, todos perdem. São empregos que deixam de ser gerados em todo o país. Esse prejuízo financeiro poderia ser revertido em investimento em escolas, hospitais e segurança, principalmente, que é um tema, hoje, do Brasil, que está muito carente”, completa o diretor.
De acordo com o Índice Global de Crime Organizado, publicado em 2022, o Brasil é o 22º país com o pior índice de criminalidade no que tange ao comércio de produtos falsificados, e fica atrás apenas de Colômbia (2º), Paraguai (4º) e Equador (11º) na América do Sul.
Ao destrinchar o ônus total para o país (R$ 453 bi) com a ilegalidade, a CNI calcula que R$ 136 bilhões equivalem a impostos que deixaram de ser arrecadados, enquanto que R$ 297 bilhões foram perdidos ao considerar os 16 setores econômicos avaliados pela pesquisa. Além disso, o restante do valor integra os furtos de energia e água.
Segundo o gerente de infraestrutura da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), Isaque Ouverney, o valor perdido com o furto de energia no país no ano passado é equiparado ao abastecimento de toda a região metropolitana de São Paulo por um ano. “A gente perde aqui valores que são cada vez maiores em termos de energia, em termos de água e esgoto, que são perdidos aqui todos os anos”, comenta.
De acordo com a pesquisa, somente os chamados ‘gatos’ (ligações clandestinas) de energia custaram R$ 6,3 bilhões ao país em 2022. Como explica a CNI, o valor poderia ser utilizado em novos investimentos no setor, além da melhoria da qualidade do serviço no país, que tem sido alvo de críticas mais rotineiras este ano, como o caso dos apagões em São Paulo, por exemplo.
No caso do abastecimento de água, dados disponibilizados pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) estimam que as ligações irregulares nas redes de abastecimento do Brasil causaram prejuízo de R$ 14 bilhões aos cofres públicos no ano retrasado. Para se ter ideia, o volume total de água desviado por ano no país equivale a 2,6 vezes o volume do Sistema Cantareira.
Além de ser prejudicial aos governos, essas práticas ilegais também causam danos a toda a sociedade, como explica o gerente de infraestrutura da Firjan. “Quando a gente olha para o setor de infraestrutura, a gente vê que são recursos que estão sendo drenados de potenciais investimentos para a expansão do sistema, principalmente quando a gente fala em termos de saneamento, que é um desafio brasileiro, e também recursos que poderiam ser destinados para a redução das tarifas”, pontua Ouverney.
A pesquisa da CNI também mostra que, nos 16 setores analisados, o mercado ilícito brasileiro foi responsável pela perda de cerca de 370 mil empregos diretos com carteira assinada em 2022. Nesse sentido, o setor que mais foi afetado foi o de vestuário, com 67 mil postos de trabalho a menos.
Outros setores, como o farmacêutico e o de combustíveis, também deixaram de empregar 20,7 mil e 15,5 mil trabalhadores, respectivamente, por conta desse mercado informal. “Então são oportunidades de desenvolvimento em regiões que necessitam, muitas vezes, regiões que estão carentes, que deixam de acontecer, por conta do mercado ilegal”, avalia, ainda, o gerente de infraestrutura.
Apesar de parecer vantajosa à primeira vista, a opção de comprar um produto ou adquirir um serviço de maneira ilegal pode causar sérios transtornos ao cliente. Além do prejuízo financeiro com a compra de itens de qualidade inferior, há também perigos para a saúde. Como ressalta a advogada da Kasznar Leonardos, Raquel Barros, produtos irregulares não passam por controles de qualidade adequados, e podem conter substâncias tóxicas ou prejudiciais.
“Por exemplo, eletrônicos falsificados podem apresentar risco de incêndio ou explosão devido a falhas na fabricação; calçados falsificados podem causar danos às articulações; óculos de sol falsos podem prejudicar a retina. Além disso, há o risco de intoxicação decorrente do consumo de bebidas falsificadas, medicamentos, cosméticos, entre outros”, alerta a jurista.
Para evitar cair nesses enganos, o consumidor deve ficar atento a alguns aspectos. Segundo a advogada, o principal é conferir a origem e o preço do item a ser comprado. “Com o fácil acesso à internet, o consumidor pode verificar os preços praticados pelas lojas oficiais e deve desconfiar sempre que um item for vendido por um valor significativamente abaixo do praticado pela loja oficial”, esclarece a advogada Raquel Barros.
Além disso, também é recomendável comprar de lojas ou vendedores confiáveis e reconhecidos no mercado, como aconselha o advogado especializado em direito do consumidor e sócio no Machado de Carvalho Advocacia, Mozar Carvalho.
“(É necessário) verificar a autenticidade dos produtos, procurando por selos de autenticidade, códigos de barras e outras características que comprovem a originalidade do produto, é essencial. Além disso, preços muito baixos, especialmente em relação a produtos de marcas conhecidas, podem indicar que o produto é falsificado ou contrabandeado”, recomenda.
Caso o consumidor deseje prestar queixa contra vendedores que anunciam produtos falsificados ou contrabandeados, é possível fazer uma reclamação formal às autoridades competentes, entrando em contato com órgãos de defesa do consumidor, como o Procon, ou com a polícia. Como explica o advogado, é recomendável dar a maior quantidade possível de detalhes sobre o vendedor e o produto em questão.
“É importante fornecer o máximo de informações possíveis, como nome, endereço, site ou perfil nas redes sociais do vendedor, juntamente com evidências que comprovem a venda de produtos ilegais. Dessa forma, as autoridades poderão investigar e tomar as medidas necessárias para combater essas práticas ilegais”, explica o advogado Mozar Carvalho.
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