A esquerda precisa ir para rehab

A esquerda paulistana precisa ir para a reabilitação. Mas não para se reorganizar e pensar em seus erros. Ela tem que se ver livre do vício da arrogância. Perdemos tanto tempo tentando provar o quanto estávamos certos, o quanto éramos altruístas e melhores por pensarmos de forma coletiva, que esquecemos de dialogar com aqueles que garantimos defender, os menos favorecidos.

Rebuscamos nossa linguagem de forma subjetiva a ponto de não dialogar justamente com aqueles que dizemos mais prezar. Depois, nos mostramos surpresos quando a periferia não entendeu o recado. E assim como a direita cansou de ser xenófoba, dizendo que o Nordeste não sabia votar, a esquerda voltou às indignações aos pobres, usando termos como “pobre de direita”, “não sabem o que estão fazendo”, “abusaram da ignorância da periferia”, como se ela fosse uma massa homogenia e imputável, incapaz de pensar por si só.

A esquerda não sabe onde errou porque nunca fez realmente questão de ouvir as vozes que ecoam nos extremos, somente quis guia-la e não empoderá-la. Doria eleito no primeiro turno e Haddad tendo seu melhor desempenho nas urnas em Pinheiros foi um choque de realidade.

Nos fechamos em nossa bolha, muitas vezes tão pseudo-politizada quanto acusamos muitas vezes a direita, e achamos que o mundo se resumia em ciclovia, carnaval de rua, Paulista aberta, Catuaba na Roosevelt e muito amor em SP. Foi aí que Haddad ganhou a simpatia dos jovens que circulam pelo grande centro, mas há tantos outros jovens que mal saem do seu bairro.

Ganha aquele movimento que é melhor articulado e organizado. E a direita soube fazer isso, para o espanto de muitos que não titubearam antes de relativizar a inteligência de seus integrantes. Enquanto a esquerda fazia mil jograis, falava em movimentos horizontais, se negava ideologicamente a lutar do lado de quem pensasse muito diferente do grupo, a direita foi lá e se mobilizou, foi às ruas e, com o apoio dos chamados golpistas ou não, conseguiram o que queriam.

A direita às ruas ao lado de pessoas que pediam intervenção militar, volta da monarquia, pena de morte e outras coisas que não era a pauta de todos, mas eles tinham o fim em comum e isso para eles bastava. Enquanto isso, a esquerda “xingo muito no Twitter” passava horas descredibilizando os atos.

A meta da direita, tão legítima quanto qualquer uma vinda da esquerda, falou mais alto, a ponto de fechar os olhos para esses grupos menores e lutarem lado a lado. Até quando vamos ficar chamando todas as pessoas de manipuláveis, como se fossemos imunes a qualquer tipo de manipulação?

Não é do feitio da esquerda lutar sem ideologia e nem ao lado de quem não acha certo e isso não precisa mudar, mas ela aceitou as regras do jogo que tanto criticou. Se tornou arrogante, agressiva e intolerante.

Enquanto achávamos que as pessoas de direita, muitos amigos e familiares, evitavam discutir política conosco porque eles não aguentavam nosso “poder argumentação”, na verdade era porque nos comportávamos como detentores da verdade. E ninguém suporta conversar com alguém assim, seja sobre qualquer assunto.

Lutamos por uma democracia participativa, mas tiramos o corpo fora quando nos pedem para propor soluções. Ouvi certa vez de um porta-voz de um movimento que não cabia a eles dizer o que fazer, apenas reivindicar e a prefeitura que buscasse os meios de atender. É a democracia participativa à revelia da situação.

A discussão sobre economia na esquerda é pífia. Quantos perderam a argumentação quando foram confrontados com esse assunto? Cobramos a implementação de mais programas sociais, mas os meios de se fazer isso não entra na pauta. Tudo isso custa dinheiro. Qual a posição econômica não utópica que a esquerda tem proposto para conseguir promover todos os benefícios sociais que luta a favor?

O debate se empobrece quando apenas dizemos que o outro está errado. Esquerda e direita já contribuíram muito para a construção da sociedade. Todos os movimentos trazem benefícios em detrimento de alguém. A diferença está apenas no bônus que os ônus que legitimamos nos traz.

Fonte: Brasil 247

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